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Livre-arbítrio

Posted on 08/09/202508/09/2025 by Paulo Gontijo

Terminei hoje a leitura do livro “Determinados, a Ciência da vida sem livre-arbítrio”, do badalado escritor Sapolsky.

O livro é um convite a repensar a vida, sobre o que nos parece quase que óbvio atualmente, frente a tantos influencers e coachs que inundam a internet: A falácia de que para ser rico, ter um corpo forte, ser feliz, só depende da gente. É como se o mundo gritasse: “se você é bom, foi porque você teve força de vontade, se você é um fracassado, compre meu curso e poderá mudar de vida”.

Acredito de fato na transformação por meio da educação, que nos permite conhecer mais sobre nós mesmos e sobre o mundo, a ponto de fato de mudar e esculpir nosso futuro. Mas se não existe livre-arbítrio (de acordo com Sapolsky), para que estudar? Para que mudar o futuro, se já está tudo definido?

Quero usar a minha história para trazer mais clareza sobre como penso o livre-arbítrio depois da leitura deste livro. Se quiseres 1000 outros exemplos, embasados na neurociência, recomendo a leitura do livro. A minha história apenas ilustra os conceitos, não tem pretensão nenhuma de ser estilo de vida e de ação a ser seguido.

Em 2000 iniciei a faculdade de ciência da computação; entre o início e o fim em 2004, ganhei 27kg, muito conhecimento na área de tecnologia, muitas novas amizades que duram até hoje e várias crises de gastrite oriundas do excesso de álcool. Este período foi o alicerce para uma carreira que considero bem sucedida e ao mesmo tempo a fonte de problemas de saúde que culminaram em indicadores de saúde como pressão e colesterol altos.

É aqui que começa uma bifurcação do caminho que uso para ilustrar o livre-arbítrio, ou melhor dizendo a ausência dele. Por volta de 2012, minha esposa estava grávida e eu já refletia sobre as minhas novas responsabilidades: ser pai.

O trabalho estava extremamente estressante, eu empurrava um dia após o outro, tentando me livrar de cada novo problema que aparecia diariamente. Nos finais de semana (que já começava na quinta-feira) eu me anestesiava com álcool e comida em excesso. Eis que, num exame periódico o médico me disse de forma sarcástica: “Parabéns, apesar dos seus 30 anos, sua idade biológica é de 70. Se quiseres ver a sua filha crescer, mude de vida”.

Pois é… não escolhi passar por aquele médico, aliás, vários médicos constataram ao longo dos anos, os mesmos péssimos indicadores e se limitaram a dizer: cuide-se, mas aquela frase, combinada com o momento de vida em que eu estava, mudaram radicalmente o rumo da minha vida.

O fato é que alguma sinapse mais intensa aconteceu, e aos poucos, muito aos poucos, eu fui cuidando mais do corpo, inseri exercícios, dieta mais balanceada, passei a prestar mais atenção ao estresse e de pouquinho em pouquinho minha vida foi mudando. Hoje meus exames estão ótimos e minha idade biológica é 8 anos mais jovem que a idade real. Prato cheio para abrir um canal no Youtube, vender cursos de coach e receitas do tipo: faça o que eu faço e terá sua vida transformada.

Realmente, não acho que seja assim. Entendo hoje, que o que aconteceu comigo, no momento que recebi a fala do referido médico é que aquele momento de vida, culminou em uma alteração de vida, que repetida dia após dia criou um novo Paulo.

Fui livre para decidir? Eis a pergunta que ainda me pego refletindo. Para satisfazer o ego? Sim. Cientificamente falando? Não. O referido momento, que marcou a mudança, não foi uma decisão que ocorreu do nada, fruto de uma decisão que iniciou em um único neurônio e que como em uma orquestra emanou som para uma rede maior, que culminou em mudança de vida. A decisão foi fruto do que havia acontecido comigo, de forma cumulativa, nos minutos, dias, semanas e anos que antecederam a fala do médico.

Eis aqui, duas formas que ilustram a inexistência de livre-arbítrio:

(1) Ao contrário do que parece, não fui livre para escolher Ciência da Computação na Universidade Fumec, na verdade só fui pra lá pois não fui aprovado na UFMG em Engenharia, não fui livre para me encantar com a beleza da Carla, que hoje é minha esposa e mãe das minhas filhas, não fui livre para me mudar para o Rio e viver lá uma vida de estresse, afinal se eu não fosse eu perderia meu emprego, não fui livre para não vivenciar o estresse do trabalho tendo ido parar numa área que tinha como premissa funcionar 24h7.

(2) Também não fui livre para receber a notícia do médico, tal qual não fui livre para, influenciado por esta, sentir a vergonha que passei quando me olhava no espelho, gordo e sem saúde, também não fui livre ao decidir começar a praticar esportes, comer melhor. Não fui livre ao escolher ler, e me conhecer melhor através da filosofia, em detrimento a maratonar uma série da Netflix ou o feed infindável do Instagram. Tudo foi novamente determinado pelo minuto anterior, pelo dia anterior e pelo mês anterior.

O que difere a inexistência do livre-arbítrio de 1 e de 2? É que o 2, me leva para um caminho mais longevo e feliz do que 1, ainda assim, com inexistência de liberdade, ou seja, completamente determinado. Hoje já não consigo escolher uma vida sem alimentação saudável e esporte.

Quero dizer que assim como não escolhi 2, também não escolhi 1. Assim como uma criança preta e pobre que não escolheu nascer na África e levar uma vida com subnutrição e encerrada precocemente antes da adolescência, também não escolhi o que me trouxe até aqui.

O caminho mais virtuoso que me trouxe até o hoje foi fruto não de liberdade de escolha, foi fruto do que me aconteceu ontem, na semana passada, no ano passado, além do que aconteceu na minha infância, no meu ambiente, nos meus hormônios e tudo mais.

Por fim, o caminho 2, que me trouxe até aqui, com melhor saúde, alegria de viver e autoconhecimento, provavelmente vai me levar a caminhos melhores. É portanto uma espiral ascendente e novamente, é fruto do que me aconteceu minutos, horas, dias e anos atrás. A diferença é que agora, este passado, tem melhores pegadas que provavelmente (e não com 100% de certeza) me levarão em direção a um caminho melhor do que as pegadas do caminho 1.

Difícil de aceitar né? Confesso que ainda me causa estranheza pensar que 100% do que faço no agora não é livre, mas o argumento principal que o Sapolsky provoca é: não há geração espontânea de ideias nem ação, é tudo fruto do que foi feito ou impacto nos momentos anteriores. Se retrocedemos nossa vida minuto após minuto, vamos parar no princípio dos tempos. Tempos estes que influenciaram, definiram e continuaram a nos definir quem somos.

Category: Reflexões

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